Por: Gabriel Montenegro, psicólogo e professor
Quando criança meu sonho era morar em um “prédio”, era um menino pobre do interior, quando tinha oportunidade de visitar alguém que morava em apartamento eu me encantava com as subidas de elevador e a vista da sacada, aquilo fazia meus olhos brilharem. Hoje sou adulto e, somente após meu casamento, tive a oportunidade de morar em apartamento. Porém, por ironia do destino ou não, sempre morei no térreo. São 6 anos morando em apartamento em dois condomínios diferentes, mas sempre no térreo. O térreo de um bloco de condomínio, tem o costume de ser o lugar mais visitado, uma vez que todos os moradores do andar (com elevador ou sem) precisam, inevitavelmente, entrar por lá.
As vantagens de um apartamento são inúmeras, assim como as desvantagens também. Foi justamente com a experiência de morar em “apês” que construí uma maior concepção sobre liberdade. Uma vez que as paredes são finas, uma das desvantagens na moradia em prédio ganha destaque, sem dúvida nenhuma a ausência de sensibilidade por parte de vizinhos barulhentos. E não somente barulho, mas aqueles que usam de maneira exagerada de suas energias no pós horário de silêncio. Em uma dessas experiências de apartamento conto com um vizinho que, por inúmeras madrugadas de sábado para domingo e em algumas madrugadas semanais, inspira o próprio Jimi Hendrix¹ e toca sua guitarra de maneira desproporcional, seguido de gritos e mais recentemente uma Alexa de despertador eu simplesmente dura uma hora e meia sem interrupção. Sem contar os que moram em andares superiores e depositam bitucas de cigarro no meu quintal e quando chegam de madrugada, gritam ao esperar o elevador sem se lembrar que existem pessoas dormindo no andar térreo.
Os exemplos já citados são de uso indevido da liberdade, mas o que é liberdade? Liberdade é capacidade de autonomia, de ter opção de decidir, de escolher, de fazer juízo por si próprio(a), sem obrigação ou constrangimento por determinação social. Porém, ser livre não é desconsiderar o convívio e a necessidade de acordar, conciliar na demais liberdades de outras pessoas; liberdade não é uma licença em que cada um faz o que quiser, mas sim, fazer seu capricho dentro das normas coletivas.
Jean-Paul Sartre (1905-1980)², dizia: “nós somos condenados a ser livres”, a liberdade é uma responsabilidade grande; porque ela implica o nosso bem-estar mas também o bem-estar do outro em nossa volta. Já dizia minha vó e/ou até você que está lendo esse texto “sua liberdade termina quando começa a do outro”. Então é um dever refletir bem antes de fazer o que quiser, sem ser contrariado, é sempre importante pensar quando se trata de ações públicas sobre as consequências reais na vida daqueles que estão a sua volta, os queridos e até os não conhecidos. Pois, nós somos, de fato, aquilo que escolhemos e os resultados que assumimos.
¹ Jimi Hendrix, foi um famoso guitarrista norte-americano.
² Jean-Paul Sartre, foi um famoso filósofo francês.